20 de abril de 2012

1984 George Orwell


Winston, herói de 1984, último romance de George Orwell, vive aprisionado na engrenagem totalitária de uma sociedade completamente dominada pelo Estado, onde tudo é feito coletivamente, mas cada qual vive sozinho. Ninguém escapa à vigilância do Grande Irmão, a mais famosa personificação literária de um poder cínico e cruel ao infinito, além de vazio de sentido histórico. De fato, a ideologia do Partido dominante em Oceânia não visa nada de coisa alguma para ninguém, no presente ou no futuro. O'Brien, hierarca do Partido, é quem explica a Winston que "só nos interessa o poder em si. Nem riqueza, nem luxo, nem vida longa, nem felicidade: só o poder pelo poder, poder puro".
Quando foi publicada em 1949, poucos meses antes da morte do autor, essa assustadora distopia datada de forma arbitrária num futuro perigosamente próximo logo experimentaria um imenso sucesso de público. Seus principais ingredientes - um homem sozinho desafiando uma tremenda ditadura; sexo furtivo e libertador; horrores letais - atraíram leitores de todas as idades, à esquerda e à direita do espectro político, com maior ou menor grau de instrução. À parte isso, a escrita translúcida de George Orwell, os personagens fortes, traçados a carvão por um vigoroso desenhista de personalidades, a trama seca e crua e o tom de sátira sombria garantiram a entrada precoce de 1984 no restrito panteão dos grandes clássicos modernos.
Algumas das ideias centrais do livro dão muito o que pensar até hoje, como a contraditória Novafala imposta pelo Partido para renomear as coisas, as instituições e o próprio mundo, manipulando ao infinito a realidade. Afinal, quem não conhece hoje em dia "ministérios da defesa" dedicados a promover ataques bélicos a outros países, da mesma forma que, no livro de Orwell, o "Ministério do Amor" é o local onde Winston será submetido às mais bárbaras torturas nas mãos de seu suposto amigo O'Brien.
Muitos leram 1984 como uma crítica devastadora aos belicosos totalitarismos nazifascistas da Europa, de cujos terríveis crimes o mundo ainda tentava se recuperar quando o livro veio a lume. Nos Estados Unidos, foi visto como uma fantasia de horror quase cômico voltada contra o comunismo da hoje extinta União Soviética, então sob o comando de Stálin e seu Partido único e inquestionável. No entanto, superando todas as conjunturas históricas - e até mesmo a data futurista do título -, a obra magistral de George Orwell ainda se impõe como uma poderosa reflexão ficcional sobre os excessos delirantes, mas perfeitamente possíveis, de qualquer forma de poder incontestado, seja onde for.

19 de abril de 2012

Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley

Acabada de reler a fabulosa obra "Admirável Mundo Novo" de Aldous Huxley fica apenas uma enorme satisfação. Poucos são os livros que nos deixam a pensar. E em que tudo começa verdadeiramente a acontecer depois da última linha. "Brave New World", título inspirado numa fala da personagem Miranda da obra "Tempestade" de William Shakespeare, é uma dessas. Aparece-nos retratada uma sociedade do futuro - normalizada, um verdadeiro império da técnica e um hino ao condicionamento psicológico das pessoas. Uma verdadeira sociedade totalitária em que o indíviduo se vê desprovido dessa liberdade crítica perante o mundo e, no fundo, perante si mesmo.
Dotada de uma notável e arrepiante capacidade de antecipação, a escrita de Huxley alerta para a grande escolha e o equilíbrio frágil e difícil entre a técnica e a preservação da Humanidade.

Recheada de uma critíca implícita que começa nos nomes e acompanha sempre o retrato das personagens, acabamos a leitura deste livro com um sentimento de simpatia por esta liberdade de sentirmos e sermos o nosso próprio destino. E fica um medo que brota do facto deste retrato ser, sobretudo nos dias que correm, uma possibilidade cada vez menos remota.

Como escolher entre a aniquilação total da existência, vivendo e o suicídio como o Selvagem?

Arrepia e faz o leitor sentir uma repentina claustrofobia essa ideia de que, de repente, Shakespeare, o Amor, a saudade, a família e mesmo a tristeza e a morte desapareçam sob um manto de felicidade vazia. Arrepia a manipulação da vida, o roubar a escolha do indíviduo perante o seu futuro e o apagar da dúvida. Quando tudo se manipula, se calcula, se determina com base num desejo de estabilidade fica a aridez plana de um longo deserto. E, no meio desta travessia, a personagem do Selvagem é um oásis e a face disso que nos faz gente, que nos torna reconhecíveis e identificáveis no meio de uma multidão.

Lançado numa maré incerta, resta ao Homem a certeza da sua liberdade como o princípio da resposta a todas as suas dúvidas. E é isto, sem dúvida, que torna admirável este velho mundo.

Amanda Prates


Um pouco da biografia de Aldous Huxley